RELATÓRIO PEDAGÓGICO
“Arte Contemporânea: novas linguagens”
Sônia Maris
RELATÓRIO PEDAGÓGICO
1. Primeiro encontro: 25/04/2012 (quarta-feira) das 11h15min às 12h
Primeiro
encontro, muitas ideias e expectativas na cabeça. Um inevitável “friozinho” na
barriga, como em uma pré-estreia teatral. Apesar de todo estudo, preparação,
matérias selecionados com carinho, sala arrumada para recebê-los, o medo de que
o planejamento não funcione como imaginamos ou
que os alunos não se interessem pela proposta é uma preocupação que não
conseguia afastar da mente antes do início da primeira aula.
Classes
empilhadas no centro da sala, como uma Torre de Babel, papel pardo cobrindo o
chão, quadro branco com canetas coloridas, a caixa de som amplificada a postos,
alunos a caminho. A mente fervilha “Um período parece tão pouco tempo. Será que
vai dar tempo?” Essa angústia só se dissipou com a chegada dos alunos. O
convite a andarilhar pelos caminhos que se oferecem está posto. O espaço se
apresenta de forma transgressora. A música aguça os sentidos. Os olhos brilham
arregalados, curiosos, intrigados. “O que está acontecendo?” O silêncio aos
poucos dá espaço às perguntas, as risadas, todos falam ao mesmo tempo,
ansiosos, agitados, como só os adolescentes sabem ser. Solicitados a observarem
os percursos que traçaram no chão para chegarem ao ponto em que estão, eles
novamente se surpreendem. “Como assim?” Olham para o chão e tentam descobrir suas
pegadas, marcadas pela força de seu próprio peso e pela poeira grudada nas
solas dos tênis. Mais um momento de excitação e euforia. Não conseguem separar
o traçado dos seus passos dos colegas. Eles se cruzam, misturando-se numa trama
divertida, alguns mais fortes, outros quase imperceptíveis, passos curtos,
passadas largas, pés grandes e pequenos. A turma se diverte tentando descobrir
por onde vieram e a quem pertence cada marca no chão. Questiono sobre suas
escolhas, trajetos, caminhos que percorreram, sobre o que os torna individual e
onde começa o coletivo. Solicitei que escrevessem no quadro essas sensações,
impressões, questionamentos... O período de aula passou voando...A saída, as
perguntas continuavam rondando as cabeças de todos...Pedi que eles tomassem
notas das impressões pessoais que tiveram a partir dessa experiência e que nas
próximas aulas falaríamos sobre isso.
2. Segundo encontro: 02/05/2012(quarta-feira) das 11h15min às 12h
Antes
de iniciar a segunda aula, algumas dúvidas ainda me assombravam: Teriam os
alunos aproveitado o momento de sensibilização? Conseguiriam fazer a relação
entre a experiência vivida e a arte contemporânea? Não tem como antecipar essas
questões; o jeito é seguir para a aula e comprovar os resultados com os próprios
olhos.
Começada
a segunda aula, já menos ansiosa, aguardei os alunos na sala de vídeo e apresentei
o vídeo “O que é arte contemporênea?” (5’28”) e discutimos questões que o vídeo
apresentava, como: O que é arte? Para que serve a arte? A arte contemporânea tem alguma utilidade? O
que a arte contemporânea tem a ver com o nosso cotidiano? Tentando fazer com
que os alunos relacionassem a aula anterior com o que eles estavam discutindo
agora.
Os
alunos, no começo um pouco tímidos, quando começam a falar, ninguém consegue
pará-los. Novamente, uma profusão de ideias, perguntas e respostas simultâneas,
minha Babel estava materializada naquela sala de aula. Sugeri que tomassem
notas do que achavam de mais significativo e do que os colegas falavam, além de
suas dúvidas e inquietações, que isso ajudaria a organizar seus
pensamentos.
Para
ajudar a explicar o inexplicável, me socorri em outro vídeo (12’) que trata do
mesmo tema, que me pareceu apropriado no momento, “Isso é arte?” itaucultural, da
coleção arte na escola, que traz, além de imagens da arte contemporânea, trechos
de uma palestra muito interessante do professor Celso Favaretto. Creio que esse
documentário enriqueceu muito a nossa discussão. Todos ganharam com a apreciação
desse vídeo. Creio que principal função da arte, que é a de ensinar a ver e
sentir de outra maneira, foi assimilada por todos. Ao fim da aula, os alunos já
estavam se achando os mais contemporâneos da escola.
3. Terceiro encontro: 09/05/2012(quarta-feira) das 11h15min às 12h
A
terceira aula também foi realizada na sala de vídeo. Para esta aula, foi
preparada uma seleção de imagens (link nas referências) dos artistas
contemporâneos (Helio Oiticica, Chisto e Jeanne-Claude, Nuno Ramos, Eduardo
Srur, Nelson Leirner, Tunga, Cildo Meireles) com sua produção mais significativa.
O convite era para apreciar as obras e conhecer um pouco das diferentes
poéticas de cada um dos artistas que trabalhavam com arte contemporânea, muito
especialmente com as instalações, foco de atenção principal. Partindo do
conceito já internalizado de que arte não é cópia, mas criação de algo novo,
que pode se apresentar através de diferentes linguagens (verbais e não
verbais), aguçando nossos sentidos (visão, olfato, tato, audição) e servindo de
meio de comunicação e expressão artística, partimos para essa aventura. Falamos
sobre as obra, os artistas, sobre os processos de criação, os materiais
utilizados, os resultados que obtiveram, as motivações dos artistas para
escolher determinados temas e poéticas, os suportes que cada um deles utilizou
em suas criações. Nessa aula, a partir de suas anotações e interesses, os
alunos já puderam escolher o artista e a linguagem (videoarte, instalação,
performance, intervenção...) que pesquisariam e produziriam o projeto com seus
grupos. Para essas escolhas eles poderiam buscar as referências nos sites
sugeridos na listagem que eles receberam ou ainda buscar outras. A definição
final somente seria comunicada ao professor na aula seguinte.
4. Quarto encontro: 16/05/2012(quarta-feira) das 11h15min às 12h
O
quarto encontro foi totalmente dedicado a exploração e desenvolvimentos dos
projetos de cada grupo, em sala de aula. Já com seus artistas e linguagens
praticamente definidos, a pesquisa se deu dentro e fora da sala de aula. Muitas
dúvidas, os grupos demoraram muito tempo para decidir-se por um ou outro
artista.
Os
grupos formados ficaram muito desequilibrados, como seria de esperar em uma
turma com um número tão expressivo de alunos. Havia três grupos bastante ativos
e que tinham bastante clareza do que gostariam de produzir; e, outros que não
tinham ideia de por onde começar. Dos grupos que já tinham algo alinhavado: o
primeiro grupo era imenso, muitos componentes, alguns já com alguma experiência
em teatro, queria fazer uma performance com fantasias assustadoras no meio
pátio, causando espanto em todos. Optaram por provocar o estranhamento. Outro,
claramente inspirado pelo Christo e a Jeanne-Claude queria empacotar algumas
árvores, relacionando isso ao meio ambiente degradado. Sua opção clara foi a do
envolvimento político, da denúncia ecológica. Um terceiro grupo, trabalharia
com arte conceitual, numa inspiração que misturava Cildo Meireles, Vik Muniz e
Eduardo Srur. O espaço re-significado, o objeto cotidiano reinventado com
materiais inusitados, insólitos. Esses grupos já partiram para sua pesquisa e
produção de forma bastante autônoma, sem que eu precisasse interferir ou ajudar
muito.
Os
demais grupos estavam muito perdidos e precisaram de atenção redobrada. A ideia
que eles tinham de que arte tinha que ser “bem feita”, “bonita”, “bem acabada”
para ter valor estava emperrando a sua criatividade. Foi bastante difícil
convencê-los do contrário. Penso que mesmo tendo conseguido que eles se
envolvessem e produzissem algo que falasse de seus desejos, medos, inquietações,
ainda não tenho certeza se esse grupo entendeu que no processo, no
envolvimento, na experiência estava a chave do seu fazer poético. Não
conseguiam perceber como transformar o seu cotidiano em arte, nem a relação
entre o que eles viam e faziam com alguma coisa que pudesse ser considerada
arte. Difícil. No final da manhã, os grupos remanescentes formaram três grupos,
que se uniram por interesses em comum. Um deles trabalharia com a ideia do
registro fotográfico das artes que se utilizam do movimento (música, dança,
teatro) através de uma instalação fotográfica. Outro grupo trabalharia com a
questão da identidade e da memória, montando um vídeo com fotografias da
escola, desde sua fundação até os dias de hoje. Um último grupo ainda está com
dúvidas entre um vídeo de música cover ou uma instalação. Não quero
pressioná-los, tenho tentado dar sugestões, apontar algumas possibilidades, mas
eles são bastante tímidos, e não querem se expor. Vamos encontrar uma solução.
5. Quinto encontro: 23/05/2012(quarta-feira) das 11h15min às 12h
Dando
continuidade a elaboração dos projetos, tivemos um encontro em sala de aula,
com os grupos formados e trabalhando. As solicitações eram muitas; difícil
trabalhar com 45 adolescentes ávidos por conhecimentos, em apenas 50 minutos.
Muitas vezes pensei que não daria conta de tanta coisa. O mural que planejei
foi descartado sumariamente, uma lástima. Pensei que a ajuda individual, por
grupos, seria mais útil, e menos constrangedora, tendo em vista que um grande
número de alunos estava com dificuldade no planejamento dos seus projetos.
6. Sexto encontro: 30/05/2012(quarta-feira) das 11h15min às 12h
No
sexto encontro tive ajuda extra para atender aos inúmeros pedidos de ajuda, a
tutora Marta Ramos Collares, esteve presente e pode constatar o quanto os
alunos nos solicitam. Nessa aula, finalizamos os planejamentos, definimos os
últimos ajustes para as instalações. Listamos os possíveis nomes para a mostra
de trabalhos, ainda sem definirmos o nome final. Retomaríamos a votação em outro
dia para que eles pudessem dar sua opinião e escolher o nome da mostra. Finalmente,
o último grupo, dos indefinidos, que queria a princípio produzir um videoclipe
com cover de músicas que eles gostam, acabou se decidindo por uma instalação
que contemplasse uma problemática bastante séria na nossa escola, na qual os
alunos tem uma certa parcela de responsabilidade, que é a questão da depredação
das classes e do excesso de lixo produzido. A presença da supervisora que
inspirou a garotada, e eles arregaçaram as mangas e se puseram a
trabalhar.
Imprevistos
e acontecimentos que mudam nossos planos devem estar sempre no horizonte de
qualquer professor, seja de que área for. No caso, do estágio não foi
diferente. Houve uma mudança de horário, devido a trâmites
administrativos/pedagógicos e o horário mudou, de quarta-feira para
terça-feira.
Isso
causou um certo transtorno, pois na terça-feira seguinte, que eu deveria entrar
em aula, havia no calendário as Olimpíadas de Matemática.
Então,
negociações entre supervisão, direção e professores da escola, para que o
estágio não atrasasse, conseguiu-se chegar a um acordo e o período de Arte pode
ser trabalhado no dia 12/06 (terça-feira), seguido de um período no dia 15/06
(sexta-feira).
Passadas
essas negociações, os alunos foram avisados que teriam mais uma semana para o
planejamento e finalização de suas instalações para a Mostra na escola.
7. Sétimo encontro: 05/06/2012 (terça-feira) mudou para 12/06 (terça-feira) das
11h15min às 12h, em função das Olimpíadas de Matemática
Tudo
pronto para o grande dia da Mostra dos Trabalhos “A Arte é uma Viagem”. Os
alunos estavam bastante seguros do que queriam mostrar aos colegas, mas o
friozinho na barriga, aquele que todos nós sentimos diante de algo novo ou
diferente, estava presente.
Desde
cedo os alunos começaram a chegar com suas malinhas cheias de apetrechos,
maquiagem, ferramentas, equipamentos os mais variados, tudo que eles
consideraram fundamentais para que conseguissem montar sua exposição de
trabalhos. Os grupos estavam bem organizados e pareciam saber exatamente o que
fazer. Toda aquela “bagunça criativa” havia trazido todos até esse momento, e
agora era só colocar em prática aquilo que foi pensando, planejado e criado por
eles.
Gratas
surpresas se materializavam a olhos vistos. Dificuldades momentâneas que
surgiam eram contornadas com bom humor e um espírito de pertencimento ao grupo
que recompensou cada minuto de dúvida que pudesse ter. Aos poucos, os espaços
foram sendo tomados e seus trabalhos ganharam vida.
O
professor é sempre suspeito a falar de seus pupilos, mas nesse caso muito
especial, tenho que dizer que todos me surpreenderam positivamente, inclusive
aqueles que estavam com bastante dificuldade de engrenar o trabalho.
Com o
título de “A arte é uma viagem” os alunos expuseram suas produções, e ficaram a
disposição, como verdadeiros artistas, falando com o público (colegas e
professores) que queria saber o que estava acontecendo; muitos ficavam
observando, perguntando curiosos, admirados, alguns apavorados, chocados...
Outros passavam ao largo, sem se aproximar, mas com os olhos vidrados... (vejam
as fotos). Sugeri que os alunos não dessem respostas diretas, que instigassem
as pessoas a pensar sobre o que elas estavam vendo, que cada um pudesse ter a
sua visão da obra e que a partir dessa leitura, eles poderiam dizer alguma
coisa que contribuísse para o entendimento do espectador. A ideia do grupo de
alunos de causar impacto, estranhamento e reflexão fui plenamente atingida.
Alguns exagerados chamaram a mostra de Bienal (numa clara alusão a Bienal do
Mercosul, com a qual muitos já tiveram contato). Achamos muito divertido tudo
isso e ficamos até com uma pontinha de orgulho. Até por que não consideramos
que um mostra de apenas uma turma devesse causar tanto impacto. Ficamos até
imaginando como seria se toda escola pudesse participar e mostrar suas obras.
Quem sabe? Temos o Projeto Ler é Arte em outubro e os alunos já estão pensando
no que vão fazer para a Mostra. Não querem repetir. São realmente muito
contemporâneos esses alunos.
Mostra de Trabalhos “A
arte é uma viagem”
8. Oitavo encontro:
12/06/2012 (terça-feira) mudou para 15/06 (sexta-feira) das 11h15min às 12h
O que
parecia um inconveniente, a troca de horário, acabou sendo uma coisa muito boa,
pois ao poder fazer a auto-avaliação três dias após a mostra, foi providencial.
Estava tudo “fresquinho” na cabeça dos alunos. Eles acabaram de vivenciar uma
experiência única e as impressões que ficaram foram muitas. Eles próprios
passam a comentar seus trabalhos e apontar os pontos fortes, os aprendizados,
as curiosidades...
A
Mostra de Trabalhos “A Arte é uma viagem” teve como
pesquisadores-produtores-executores seis grupos: quatro deles trabalharam
exclusivamente com instalação, um com videoarte e um com performance. Uma
curiosidade a respeito da produção dos trabalhos foi a presença de nomes dos
trabalhos em inglês: “Thriller” para nomear a performance inspirada nos
parangolés do Oiticica, “The Crazy of Art” para a arte conceitual inspirada no
Cildo Meireles, “Tree Alone” para a instalação inspirada no Christo e
Jeanne-Claude; um dos grupos nomeu seu trabalho em latim: Hodiernis Art, com a
instalação fotográfica sobre a arte em movimento; o grupo com “Consciência”
criou uma instalação sobre o lixo e a depredação das classes escolares, dividido
em três espaços diferentes: um simulacro de sala de aula reproduzido no palco
central, um letreiro gigante no pátio, e um conjunto muito interessante de
classe e cadeira, onde um cesto de lixo estava vazio com uma pá e uma vassoura
ao lado e o lixo se acumulava a sua volta, em que o visitante-espectador era
convidado a recolher o lixo do chão e colocar no cestinho, numa clara
provocação para que o visitante deixasse a passividade e passasse à ação.
Quando
questionados quanto a como a arte pode mudar a vida? Os alunos responderam da
seguinte forma: “Através de novas ideias e novos conceitos” (A.C.), “Como uma
forma de expressar nossos sentimentos e fazer protestos pelo que nós achamos
certo” (B.) “Para tornar visível a real verdade das pessoas do mundo e a
imaginação” (F.), “As vezes as pessoas se espelham ou se expressam na arte da
qual foi proporcionada e assim podem tentar mudar o mundo” (G.), “Para tornar
visíveis nossos sentimentos nunca descobertos” (L.), “A arte pode mudar até seu
jeito de pensar. Pela arte podemos ter muitas oportunidades de conquistas e
aprendemos muitas coisas com ela” (I.), “Serve para reviver as lembranças do
passado e do presente que vamos levar para o futuro” (K.), “ A arte como desejo
de mudar” (D.)
Novamente,
a questão do tempo que nos consome. Muito do que foi vivido não pode ser
traduzido em palavras por todos os alunos. A opção de trabalhar em grupo, se
por um lado facilita a vida do professor, e oportuniza que os alunos se
organizem de forma a deixar os que são mais falantes tomem a frente, por outro,
deixa os mais tímidos sem voz. Isso é uma das coisas que devem ser corrigidas
num próximo trabalho. Mais tempo e espaço, para dar voz aos invisíveis da sala
de aula que, com certeza, têm muito a acrescentar.
5 ANÁLISE PEDAGÓGICA
“Desconfia daqueles que te
ensinam
Lista de nomes, fórmulas e datas e que
Sempre repetem modelos de cultura
Que são a triste herança que aborrece.
NÃO APRENDE APENAS COISAS
Pense nelas
E constrói sob teu desejo
E imagens que rompam a barreira que asseguram
Existir entre a realidade e a utopia:
Vive num mundo côncavo e oco,
Imagine como seria uma selva queimada,
Detém o movimento das ondas nas arrebentações,
Tinge o mar de vermelho,
Segue algumas paralelas até que te devolvam
Ao ponto de partida,
Coloque o horizonte na vertical,
Faz uivar um deserto,
Familiariza-te com a loucura.”
José Agustín Goytisolo
Lista de nomes, fórmulas e datas e que
Sempre repetem modelos de cultura
Que são a triste herança que aborrece.
NÃO APRENDE APENAS COISAS
Pense nelas
E constrói sob teu desejo
E imagens que rompam a barreira que asseguram
Existir entre a realidade e a utopia:
Vive num mundo côncavo e oco,
Imagine como seria uma selva queimada,
Detém o movimento das ondas nas arrebentações,
Tinge o mar de vermelho,
Segue algumas paralelas até que te devolvam
Ao ponto de partida,
Coloque o horizonte na vertical,
Faz uivar um deserto,
Familiariza-te com a loucura.”
José Agustín Goytisolo
Trabalhar
com educação é estar sempre se reinventando e aprendendo coisas novas. Com a
prática de estágio 2 não foi diferente. Nossa experiência anterior é
extremamente válida na hora de planejar e organizar as seqüências didáticas,
mas de pouco valem se na hora de por em prática não conseguimos perceber se as
escolhas feitas estão funcionando para aquela turma em especial.
Trabalhar
com arte, muito especificamente, arte contemporânea foi uma experiência bastante
especial. Primeiramente, pelo fato de que esse é um conteúdo que a professora
de artes da escola dificilmente conseguia trabalhar, tanto por questões de
currículo, como por questões de falta de entendimento de sua importância.
Segundo, por que os alunos, nessa faixa etária - imersos em no mundo
contemporâneo, sentindo-se muitas vezes incomunicáveis, em que a velocidade e o
individualismo é quem manda, onde o mundo a sua volta causa estranhamento e
espanto - estão mais do que prontos para enfrentar esse desafio.
Provocar
os alunos a pensar e produzir arte como forma de desenvolver a sensibilidade e a
expressão artística, fazendo com que eles pudessem experimentar os diferentes
processos de criação no qual a ideia, a ação e o projeto é muito mais
significativo do que o resultado final; levá-los a perceber que qualquer
material pode servir para criar arte, que não precisamos de materiais caros e
inacessíveis para expressarmos nossa criatividade; perceber como a arte pode
estar conectada com a vida cotidiana de forma mais presente do que imaginamos.
A
experiência proporcionada de leitura de imagens, pesquisa, apreciação,
relacionando as obras com a vida cotidiana a partir das novas linguagens da
arte contemporânea, do trabalhar coletivamente para um mesmo fim, das produções
textuais que tinham por fim levá-los a pensar sobre a arte contemporânea
possibilitou que os alunos se expressassem de forma mais livre e pudessem ver
com outros olhos a arte contemporânea, tantas vezes incompreendida por falta de
proximidade e desconhecimento de seus signos.
Mais
do que adquirir informação, os alunos tiveram uma experiência ímpar para
desenvolver sua percepção, observação, imaginação e sensibilidade para a arte
contemporânea, através de exercícios de fruição, pesquisa e prática de forma
contextualizada.
6 AVALIAÇÃO
Os Meus Pensamentos são Todos Sensações
Sou um guardador de rebanhos.
O rebanho é os meus pensamentos
E os meus pensamentos são todos sensações.
Penso com os olhos e com os ouvidos
E com as mãos e os pés
E com o nariz e a boca.
Pensar uma flor é vê-la e cheirá-la
E comer um fruto é saber-lhe o sentido.
Por isso quando num dia de calor
Me sinto triste de gozá-lo tanto.
E me deito ao comprido na erva,
E fecho os olhos quentes,
Sinto todo o meu corpo deitado na realidade,
Sei a verdade e sou feliz.
Alberto Caeiro, in "O Guardador de Rebanhos - Poema IX"
Heterónimo de Fernando Pessoa
O rebanho é os meus pensamentos
E os meus pensamentos são todos sensações.
Penso com os olhos e com os ouvidos
E com as mãos e os pés
E com o nariz e a boca.
Pensar uma flor é vê-la e cheirá-la
E comer um fruto é saber-lhe o sentido.
Por isso quando num dia de calor
Me sinto triste de gozá-lo tanto.
E me deito ao comprido na erva,
E fecho os olhos quentes,
Sinto todo o meu corpo deitado na realidade,
Sei a verdade e sou feliz.
Alberto Caeiro, in "O Guardador de Rebanhos - Poema IX"
Heterónimo de Fernando Pessoa
Impossível
falar na prática de estágio sem pensar em
estesia. Lembro das palavras da professora Umbelina, logo no início do
curso, tentando fazer que víssemos além do visível, que percebêssemos todo
encanto por trás da aspereza da vida. E eu, tola, sempre privilegiando mais a
razão do que a emoção, cheia de certezas, achando que toda aquela conversa
nunca me afetaria, que minha visão de mundo, real, concreto, cheio de dureza e
injustiças, nunca seria afetada da forma poética como a professora tentava nos
seduzir, encantada. Dizia ela, que deveríamos sim ter um pé na realidade, mas
que nem por isso, deveríamos deixar de sonhar e de possibilitar que nossos
alunos também pudessem sonhar e criar de forma mais prazerosa. Que pudéssemos ver
com todos os sentidos, aguçados, atentos, sensíveis ao que o mundo oferece para
quem está disposto a enxergar.
A
experiência com o Estágio em Artes Visuais foi rica em vários aspectos: na
questão de possibilitar uma maior aproximação com os alunos, adolescentes, que
sempre gostam de novidade e sentem-se estimulados com propostas que provoquem
seus sentidos, que desafiem sua capacidade criativa; no entendimento de que
todos podem criar a partir de suas experiências pessoais obras que ultrapassam
a lógica da sala de aula fechada, que se abrem para dialogar com outras
pessoas, outras visões, que acrescentam e interagem com as mesmas; no
desenvolvimento de um olhar contemporâneo sobre o mundo que nos cerca; e na
capacidade que os alunos têm de sempre nos surpreender.
Sou
professora de Língua e Literatura, e muitas vezes nos deixamos levar pela
rotina, pelo material já cristalizado, pronto, acabado, e deixamos de perceber
a riqueza que uma nova abordagem, um novo olhar sobre uma mesma coisa pode
trazer. O aprendizado de valorizar o processo, a ação, o projeto - mais do que
o resultado final - ficará para outras áreas do conhecimento em que atuo. Aprendizagens
significativas que levaremos para o resto de nossas vidas.
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